Cheguei passava um pouco das seis e meia, acho. Os estudantes estavam na Paulo Fontes, ocupavam a pista que leva ao túnel. Estávamos cercados de uma lado pelo grt, do outro por um pelotão de pms. Não demorou muito a outra pista foi fechada. Uns jovens jogavam bola, outros cantavam e seguravam cartazes contra a rbs. Uma mulher dá esporro num grupo de quatro policiais que estavam na frente da tropa, diz que não tem coragem para enfrenter bandidos de verdade e ficam só atrás de estudantes. Depois de talvez um pouco mais de uma hora ali parado, fizeram uma assembléia para decidir o rumo do protesto. A primeira decisão foi o túnel, mas percebendo a merda que seria, fomos para a Mauro Ramos. Não havia muitas pessoas, na verdade mais pro final tinha até mais hômi do que estudante.
Foram andando pela rua, cantando, sempre seguidos de perto por um contingente absurdo. Na frente do IEE reduzem, mas não tem mais ninguém no colégio. Ocupamos as duas pistas, alguns carros ficam presos. Adiante a polícia já prepara desvios e a avenida fica livre. – pausa. Se no Iron Man tive que comprar filme, hoje meu cartão de memória estava com uma porção de fotos só tinha mais 20 poses. Dou um pulo em casa, descarrego-as no pc, o que leva 11 minutos. Troco as pilhas, tiro a camisa de veludo, estava calor naquela correria –. De volta à rua, não sei aonde foram. Suponho que voltarão ao terminal pela Beira-Mar. Sigo nessa direção, porém uso a cabeça e o celular. Meu amigo confirma, estão na frente do shopping. Sigo numa velocidade boa, contudo quando chego lá chego percebo que eles marcham, estão bem para frente. Fico espantado com a quantidade de pessoas, nem conseguiram fechar uma pista da avenida.
Vou atrás, o relógio informa 14º, contudo estou com calor. Os manifestantes ocupam apenas a ciclovia, quem interdita a pista de fora é o batalhão da pm. No Koxixo’s as luzes de alguns postes apagam. Vejo um cara descer à praia, pega um pedaço de pau. O guarda manda jogar fora, ele diz que é para bater num tambor, razão que não convence o meganha.
Na frente da casa do governador os policiais devem ter achado que faríamos alguma coisa e se posicionaram em duas fileiras, uma na pista, formada pelos pms e outra no canteiro que divide as pistas, com o grt. Achando que daria alguma coisa, fui para o canteiro, pois ficaria de frente para a ação. Fiz umas fotos, não deu em nada e quando me dou conta tem um cara me fotografando Botei a mão na frente da lente e perguntei qual era a dele. Questionou de onde eu era, eu muito burro falei jornalista, do jornal laboratório da facu, mostrei carteirinha e tal. – Tou fazendo meu trabalho – falei. – Eu também, também sou jornalista – diz ele. Perguntei da onde, ele fez uma voz de riso forçado e disse “sou do jornal do batalhão”. Eu – Que que tu vai fazer com essas fotos? –. – dependo do que tu fizer com as tuas –. Enquanto isso, passavam os carros do grt, com os soldados todos encapuzados. Do carro gritavam “vai fotografar o cú da tua irmã, vai pra casa seu filho da puta”. Ainda mandei eles tomarem cú,e mostrei o dedo do meio. Puto com minha própria burrice, voltei à fila que seguia em frente.
No viaduto das três pontes nova tensão, mas nada acontece. Subo no elevado para fazer fotos, lá embaixo uns berram que “tem p2 no elevado”. Hahaha, só falta me chamarem de p2 agora. Quero que os meganhas vão tudo tomar no cú, bando de filhos da puta. Claro, há muitos bons policiais, os quais respeito pelo trabalho que fazem. Mas xingar um bosta dum moleque que fotografa a manifestação, aí fiquei com raiva mesmo. E aquele p2 filho da puta, tirou uma foto minha, a vontade era de espancar o viado até desmaiar.
Chegando no Titri atravessam a avenida, param num gramado para decidir o futuro da ação. Um cara, que para mim era p2, é questionado por duas garotas. Ele se explica, mostra identidade, ela acredita. Não me convenceu, aquilo tava infestado de milico disfarçado. Um garoto do passe-livre sugere encerrar por ali, afinal entrar em confronto àquela hora seria burrice. Ouço um cara fala que “esse pesssoal do mpl só atrasa mesmo”. Felicito-me pela idéia do rapaz, não estou afim de apanhar a toa. Sugestões de ir para Ufsc ou invadir o Titri. Uma menina pega o microfone, “uma decisão não anula a outra, vamos pra Federal e lá fazemos o catracasso”. O pessoal aprova, eu também. Vamos por umas ruzinhas até a Lauro Linhares, os pelotões seguem de perto. Nessa altura já não estou preocupado em fazer fotos, ver o que acontece, quero que acabe logo. Talvez pela coisa não estar tão tranqüila quanto parecia, começam a cantar o hino nacional. Um rapaz grita “pra que esse patriotismo?”.
Na frente do Frango & Fritas uns três carros do grt – ou ppt, não sei agora, mas dá na mesmo – sobem em velocidade. Por pouco não batem em nenhum estudante, cantam pneus como parte do teatrinho. Chegando ao Comper vejo como meu preparo físico está bom, afinal andei um bocado. Como pms não podem entrar na universidade, existe certo relaxamento. Um cara vem me perguntar se fiz fotos dele, do nada estou cercado por três. A essa altura desconfio de qualquer um, e como não quero que pensem que sou policial disfarçado mostro as fotos que fiz “apago qualquer uma que tu quiser”. Ele fala que não precisa, que está tudo bem, diz não ser da pm.
Enquanto descemos o choque vem atrás em posição de combate. Estou perto da rótula do CCE, explode uma bomba de gás. A maioria corre. Não entendo, não faz sentido nos atacarem ali, com o ato quase no fim. Explode a segunda, estou quase no templo ecumênico. Um cara sai detrás duma árvore, berra “vamos lá”. Apanhar de graça não dá, ali não era situação para entrar em confronto. Mesmo porque para eles é muito fácil entrar pelos lados e moer todos nós naquela escuridão.
Aos poucos o pelotão recua, os manifestantes se concentram novamente, no ponto do CCE. Uma moça aparece com dois pedaços de ferro, diz que são a prova que a polícia usou tais artefatos na Ufsc. Entrega a outro cara, este sobe na calçada e anuncia para todos o fato. Palmas. Rápida reunião, os que vão para o centro de um lado, os que vão ao Titri de outro. Fico com os do centro. Desce um volta ao morro, as portas são abertas e todos entram por trás. Não há comentário de motorista ou cobrador. No fundo acho que eles conosco. Alguns temem que a polícia pare o carro, as janelas são fechadas por precaução, caso lancem spray de pimenta. Nada acontece. Percebo que tomei o busão errado, esse é norte. Quase na entrada do túnel um cheiro forte, as janelas são abertas. Olho para trás, está pichado “2,40 não” no fundo do ônibus.
Salto no Ticen, pegarei o volta ao morro das 23h – que é o que acabei de sair. Desamarro o lenço, sento. Contudo só me sinto tranqüilo quando subo as escadas do prédio. Preciso dormir.