Uma perna a menos, jornalismo a mais
Para que alguém consiga o título de repórter do século, é preciso mais do que prêmios. Mais ainda quando se trata do século da televisão, do século da Revolução Russa, do século do rock n’roll, do século da guerra fria, do século das duas grandes guerras mundiais. O século XX ficou na história como referência cronológica para diversos acontecimentos. Conteúdo para o jornalismo não faltou. Para tanto, exemplos como o compromisso de José Hamilton Ribeiro com a abordagem envolvente e aprofundada dos fatos é fundamental para que a prática jornalística faça parte dessa mesma história. O livro Repórter do Século traz uma reunião de textos premiados escritos pelo jornalista que esteve no hospital ora para acompanhar os primeiros transplantes de órgãos no Brasil e retratar a situação alheia, ora para tratar-se depois de acidentalmente pisar em uma mina no Vietnã e transformar sua dor em palavras.
Acima de tudo, Repórter do Século desmistifica a máxima de que o jornalista deve se distanciar do acontecimento e ficar o mais próximo possível da imparcialidade. Para expor uma história em demasiados detalhes e ocupar, inclusive, as entrelinhas do papel, José Hamilton Ribeiro, antes, viveu todas as palavras que escreveu. A coletânea conta com sete reportagens que receberam o prêmio Esso de jornalismo e mais a reportagem sobre o Vietnã. A grande maioria delas foi publicada na revista Realidade, que na década de 60 foi a contribuição brasileira para o Novo Jornalismo (reformulação na prática jornalística iniciada nos Estados Unidos por nomes como Truman Capote, Gay Talese, Norman Mailer, etc. e vigorada nas décadas de 60 e 70).
A produção jornalística de José Hamilton Ribeiro possui ritmo e elementos que envolvem o leitor. Ele opta pela elaboração de perfis de personagens como pano de fundo para as histórias. O repórter do século trata de assuntos relacionados à medicina e à ciência com naturalidade, familiarizando o leitor. As informações trazidas nas reportagens podem ser levadas a essa perspectiva, visto que são assuntos já desatualizados e que ocasionalmente não interessam a um leitor comum que esteja a procura de entretenimento com a leitura.
O livro termina com as perguntas mais freqüentes a que José Hamilton Ribeiro responde. A mais curiosa tem uma resposta original e ágil. Ele diz: “Num programa de auditório no Rio, de tevê, me perguntaram, visto que continuei minha carreira no jornalismo, se era difícil ser repórter com uma perna só. Respondi: ‘É mais difícil do que com duas, mas é mais fácil do que com quatro’”.
Arielli Secco
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