30 de maio de 2009

Aparências

Eles procuravam uma casa pequena, à beira de um lago, com muita natureza em volta. Encontraram um apartamento nojento, com vista para um mar de balas perdidas. Sonhavam em ter cada um seu próprio carro, nem precisava ser dos mais caros. Dois anos depois, encaravam três horas por dia no transporte coletivo.

Ambos prometeram, na noite de núpcias, manterem seus belos corpos da juventude o máximo de tempo possível. Seis meses depois ele ostentava uma barriga de chope e ela já havia engordado 8 kg. Ele garantiu que iria respeitá-la durante o horário da novela e nunca trocaria de canal para ver o jogo. Depois de três finais de semana juntos, as quartas, sábados e domingos se tornaram os dias do bar, onde ele enchia a cara com os amigos e nem assistia direito o futebol.

Ela aprendeu a cozinhar quando ficaram noivos. Por pouco não chegou a fazer curso de gastronomia. Tudo para agradar o futuro marido. Hoje eles almoçaram bife seco, arroz empapado, batata queimada e feijão velho.

Como todos os casais, juraram fidelidade eterna no altar. Agora, ele sempre estica as quartas-feiras na casa da primeira mulher que vê no bar e ela dorme de madrugada, depois de horas em frente ao computador, fazendo sexo virtual.

Os amigos de longa data olham para os dois e lembram-se daquele belo casal indo ao Cinema ou namorando no parque. Eles acham difícil entender por que mudaram tanto. Mas a convivência faz coisas incríveis com as pessoas.

No namoro, ele nunca falava um palavrão sequer. No casamento, seu vocabulário resumia-se a palavras de baixo calão. Ela só saía com o namorado cheirosa, sempre tomava banho. O problema é que eles costumavam se ver poucas vezes na semana. Justamente nos dias em que a garota ficava uma hora embaixo do chuveiro.

Ele andava com um belo carro e dinheiro não era problema. O pai dele era rico e liberava o automóvel. Ela usava roupas caras, mas, apesar de trabalhar bastante para pagá-las, nunca pagou uma conta de supermercado.

Ambos se amavam nas aparências. Todavia, se conheceram tarde demais.

Um comentário:

Youko Watanabe disse...

Acontece muito isso, a gente empurra nosso 'eu' pra debaixo do tapete e vai levando.. Realmente as vezes dá um medo que a convivência acabe um sentimento bacana. Mas acho que se a gente chegar mostrando as coisas, de cara.. fica menos dificil..

beeijos.

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