Durante a última semana, a nossa turma teve de fazer um trabalho de Ética e Legislação Jornalística, uma das cadeiras que precisamos cursar em nossa faculdade. Enfim, quando lia um dos textos (escrito pelo nosso professor Jaci Rocha), deparei-me com a seguinte frase: "Melhor um homem morto que uma obra de arte destruída!". Segundo Jaci, esta frase foi uma citação do arcebispo de Milão, Martini, em uma entrevista à televisão italiana.
Pois bem, logo abaixo esta citação, nosso professor diz: "Este é um exemplo de uma sentença moral, de um modo de pensar que nenhum homem e mulher bons da cabeça poderiam jamais aprovar. É claro, todos apreciamos obras de arte, porque são tesouros da humanidade, mas a humanidade é bem maior do que seus tesouros. Assim, toda doutrina ética ensina a refutar tais aberrações morais que são afins com todo tipo de preconceito racial, ou outros, contrários a todo sentimento de humanidade”.
Sou obrigado a ir contra o que ele diz. Especialmente no sentido de que as obras de arte são "tesouros da humanidade". Desde que li isso fiquei analisando tanto a citação de Martini, quanto o comentário de Jaci e cheguei à conclusão de que a arte não é um tesouro, mas sim a própria humanidade. Sempre pensei que não passávamos de animais, e a única diferença que possuíamos em relação aos outros seres deste planeta era o fato de podermos mudar completamente a natureza, de acordo com as nossas pretensões, na proporção em que julgássemos necessárias. Percebi então, que temos algo de concreto, que realmente nos difere e nos dá algo de especial nessa breve existência a qual somos submetidos aqui na Terra. E esta diferença é a arte.
Desde o início das civilizações ela sempre esteve presente. Na Idade da Pedra, os homens desenhavam nas paredes os seus medos, as suas conquistas e as suas derrotas. Na religião, desde o símbolo do Yin-Yang da cultura oriental, até os afrescos de Michelangelo na capela sistina, a arte se faz presente. A música nos dá uma dimensão de como se deram as mudanças sociais bastante claras. Basta ouvir músicas barrocas e a música eletrônica, por exemplo. A literatura, então, serviu como base para todas as pesquisas sobre as civilizações antigas.
Jaci diz que a frase que me fez pensar durante toda a semana foi dita por um colecionador de arte durante a Segunda Guerra Mundial. Ainda que para o colecionador a obra de arte fosse importante apenas como objeto estético, eu analiso esta frase sob uma outra ótica. Para mim, a frase do colecionador tem sentido, pois aquele que mata em um momento adverso sem dó nem piedade, ao salvar a obra mostra que no fundo de sua mente, ainda há um resto de humanidade que restou após meses vendo a morte diante de seus olhos. Digo isto baseado em fatos colhidos de um outro livro que acabo de ler: "Lúcio Flavio, o Passageiro da Agonia", de José Louzeiro. Lúcio Flávio foi um assaltante de bancos que se tornou famoso na década de 70, tendo feito 20 fugas, uma mais espetacular que a outra. Ele era uma pessoa extremamente violenta, que matava sem compaixão, todos aqueles que o causassem algum mal, ou a qualquer pessoa de que ele gostasse. Entretanto, durante uma das vezes em que ficou preso, teve contato com as artes plásticas. Louzeiro disse em uma entrevista à revista Caros Amigos "O Lúcio Flávio tinha tudo para ser um grande pintor. Ele queria ser pintor, político ou padre. Só para vocês terem idéia, quando ele morreu, me deixou um livro do Fernando Pessoa todo anotado. Chegou a pintar uns cinqüenta quadros. (...) Com muita influência do Modigliani (...) Uma pessoa doce transformada num bicho". Se uma pessoa doce pode ser transformada num bicho, por que não o contrário?
Arte é indagação, mas também é esperança. É só com a arte e com a cultura que uma civilização prospera. Recuperemos, portanto, quantas obras de arte forem possíveis. E criemos novas obras. Obras que deixem para a posteridade a noção de que uma sociedade melhor é possível. Obras que libertem as mentes. Obras que nos traduzam e que inspirem aqueles que serão traduzidos depois de nós.