21 de março de 2007

Fragmentos do Cotidiano

Lajotas brancas, pretas, paralelepípedos, pedras de rio. É heterogêneo o pavimento do centro de Florianópolis. Há o bairro Centro, que corresponde a uma grande área da cidade. Refiro-me, contudo, ao centro da cidade, onde tudo é comentado, o comércio é forte e o vaivém interminável. No Rio de Janeiro, o centro é de um calor insuportável e guarda um punhado de prédios imponentes, como o Teatro Municipal ou a Biblioteca Nacional.

Ao contrário do Rio de Janeiro, o centro de Florianópolis é pequenino, o mais aconchegante que conheço. Sua maior construção é a Catedral Municipal, erigida por volta de 1700. No largo da Catedral, existem cinco telefones públicos, um relógio que marca a temperatura e 21 mesas de xadrez. Estas são devidamente ocupadas por assíduos jogadores, não importando a hora do dia. Seja jogando xadrez, dominó ou canastra, sempre haverá alguém ali. Do lado, um pequeno espaço, que originalmente funcionava como ponto de informações ao turista, e hoje é um posto da polícia militar. Junto à construção, uma dúzia de sem-teto fez do local a sua casa. Apesar da placa colocada pela prefeitura, com os dizeres: “A rua não é um local digno para se dormir”, eles têm papelões como cama; e cobertas que amarradas em uma grade aqui e outra ali formam verdadeiras “suítes privativas”.

Na frente da Catedral, pombos comem e se proliferam. Antigamente eram ariscos, contudo a urbanização os domesticou. Em grande número, tornaram-se um problema de saúde pois são os hospedeiros preferidos por piolhos. Constantemente, a ave columbídea se alimenta do milho jogado por transeuntes. A maior parte deste milho provém dos coloridos carrinhos de pipoca, em cuja lateral lê-se “Pipomídia – anuncie aqui”. Dezessete pipoqueiros ocupam diversas ruas do centro, revezando-se em diferentes logradouros Juntos, explica Seu Joaquim – presidente da Associação de Pipoqueiros e Vendedores de Milho de Florianópolis – eles pleiteiam melhorias para a classe, conseguindo, inclusive, a redução na taxa do alvará.

Dentre os muitos personagens do centro da capital, a qualquer momento você pode se deparar com um sujeito se espreitando entre lixeiras e postes; de roupa vermelha, capa verde e chapelão com os dizeres: “Lampião Maluco”. Ou então com um ser de quase dois metros de altura, mini blusa, cabelo verde e chapéu com chifres. Edson Antonio ganha a vida com um mega fone, fazendo propaganda desde políticos até lojas populares. Já passou pelo estado todo e, atualmente, pode ser visto na frente da Catedral.


O balcão do Bob’s está cheio. Silvia, a moça do café, não sabe precisar quantos são vendidos por dia, mas garanta ser bastante. Os florianopolitanos tomam mais café pela manhã do que à tarde, e preferem o expresso ao simples. O local é ponto de encontro de diversos estilos, que vão de adolescentes emos a senhores que discutem política. O Bob’s já foi palco de muitas situações inusitadas, explica Silvia, como comemorações de reveillon com direito a espumante e Monte Cristo Mini. Além de ponto de encontro, a lanchonete acaba servindo de banheiro para os habituès – mesmo não consumindo nem mesmo o tradicional café expresso.

Das mesas externas do Bob’s vê-se o belo jardim do Museu Cruz e Souza, que após reformas, fica aberto ao público. Para entrar no Museu, contudo, é preciso pagar R$ 2. Estudantes não pagam meia – entrada. Antigo Palácio do Governo, hoje o local abriga um pouco do passado do município. Para não arranhar o assoalho os visitantes são obrigados a calçar enormes pantufas cinzas. Na abóbada central os nomes dos 28 municípios existentes na época.

Perto dali, um senhor de pele escura e bigode grisalho tem seu escritório. É o seu Lidomir Moraes, amolador de facas. Seu Miro, como é conhecido, veio do Porto Alegre há 20 anos. E na bagagem, apenas a bicicleta de amolar – seu instrumento de trabalho. Quando chegou existiam apenas dois amoladores em Florianópolis, hoje são seis. Trabalha das 7:30h às 17:30h. Cerca de cem peças são afiadas por dia, entre facas, alicates e tesouras. A renda do trabalho lhe permitiu trocar as passagens de ônibus por bilhetes aéreos.

Perto das seis da tarde, o movimento se intensifica; pessoas saem do trabalho, estudantes do colégio. A rua fica tumultuada. As lojas fecham às 19h. Com a noite, o vaivém cai, restam poucas pessoas, na maioria estudantes do período noturno. Depois das 23h, a cidade adormece. Da balbúrdia que se ouve durante o dia, resta apenas o murmúrio do mar.

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